A População Negra no Canadá: Ontem e Hoje

Um jovem negro segura com orgulho uma bandeira canadense.

Os canadenses negros e suas comunidades remontam ao século XVII. Talvez seus antepassados tenham sido pessoas escravizadas vindas da África, legalistas que fugiram para o Canadá após a Revolução Americana, ou membros dos quilombolas jamaicanos. Talvez eles tenham escapado da escravidão nos Estados Unidos pela Ferrovia Subterrânea ou simplesmente acreditassem que o Grande Norte era o lugar certo para recomeçar. Você pode conhecer mais sobre a história negra no Canadá lendo este artigo.

Quem Foi o Primeiro Canadense Negro?

A maioria dos historiadores acredita que Mathieu Da Costa foi a primeira pessoa de ascendência africana a visitar a Nova França (atual Canadá). Ele chegou em 1604 com os exploradores franceses Pierre Dugua de Mons e Samuel de Champlain, possivelmente como intérprete. No entanto, a primeira pessoa de origem africana documentada como residente da Nova França foi Oliver Le Jeune, uma criança escravizada que chegou em 1628, aos 6 anos de idade.

Escravidão no Canadá

Em 1689, o rei Luís XIV da França autorizou os colonos da Nova França a escravizarem indígenas e pessoas negras. Este foi o início de muitos anos de escravidão e crueldade que afetaram milhares de vidas.

Alguns historiadores estimam que cerca de 4.000 pessoas de origem africana foram trazidas para as colônias que mais tarde se tornariam Quebec, Ontário, Nova Escócia, Ilha do Príncipe Eduardo e New Brunswick. A maioria foi levada diretamente para a Nova Escócia, ou Acádia, como os franceses a chamavam. Uma coleção de documentos relacionados a essas pessoas pode ser consultada e estudada nos Arquivos da Nova Escócia.

Ilustração de um navio negreiro de 1835

Nem todos os primeiros imigrantes negros no Canadá foram escravizados. Alguns já eram livres, outros conquistaram a liberdade com esforço, e muitos chegaram ao Canadá recém-libertos.
Durante a Revolução Americana (1775-1783), quando as colônias americanas lutavam contra os britânicos por independência, os britânicos prometeram liberdade a qualquer pessoa negra escravizada que se unisse às suas forças. Após a derrota britânica, muitos legalistas fugiram. Os legalistas negros se estabeleceram em diversas partes da Nova Escócia. A maior dessas comunidades ficava em Birchtown. Outras incluíam Brindly Town, Preston e Southville.

O Livro dos Negros é um documento fundamental que registra os nomes de refugiados negros que imigraram para a Nova Escócia após a Guerra Revolucionária. Ele contém os nomes e descrições de 3.000 refugiados registrados a bordo de navios que partiram de Nova York com destino à Nova Escócia entre 23 de abril e 30 de novembro de 1783.

Esses refugiados enfrentaram forte discriminação. Por esse motivo, cerca de 1.200 legalistas negros emigraram para Serra Leoa em 1790.

A escravidão de pessoas negras foi diminuindo gradualmente no final do século XVIII. O parlamento de Ontário (então chamado Alto Canadá) aprovou uma lei que limitava a escravidão. O estatuto de 1793 proibiu a importação de pessoas escravizadas, mas não libertou os que já estavam nessa condição. A lei determinava que os filhos de mulheres escravizadas nascidos após essa data seriam livres aos 25 anos. Também ditava que qualquer escravo que chegasse ao Alto Canadá seria considerado livre.

A escravidão só foi abolida de fato no Canadá com a Lei de Abolição da Escravidão de 1834, válida em todo o Império Britânico. Ainda assim, a lei libertava apenas crianças com menos de 6 anos. Os demais foram transformados em aprendizes e continuaram trabalhando por vários anos sem remuneração.

Quem Eram Os Maroons da Jamaica?

Trelawney Town, principal moradia dos maroons na Jamaica no final do século XVIII

Após o extermínio dos povos nativos da Jamaica pelos espanhóis no século XVI, os colonizadores passaram a importar pessoas escravizadas da África Ocidental para trabalhar nas plantações de açúcar. Em 1655, os britânicos tomaram o controle da ilha. Muitos escravos fugiram para as montanhas e colinas da ilha. Os britânicos chamaram esses fugitivos de “Maroons".

Os maroons e os britânicos lutaram por séculos, sem que os britânicos conseguissem dominá-los. Após a Segunda Guerra dos Maroons, entre 1795 e 1796, alguns foram levados a se render por meio de promessas falsas. Posteriormente foram deportados. Cerca de 500 maroons jamaicanos de Trelawny Town foram forçados a deixar suas casas e realocados para a Nova Escócia, no Canadá.

Muitos se adaptaram a nova cultura, mas nem todos se sentiram acolhidos ali. Em 1800, um grupo formado por 177 mulheres, 151 homens e 222 crianças recebeu autorização para se mudar para Serra Leoa, na África Ocidental.

Aqueles que permaneceram na Jamaica desenvolveram, ao longo dos séculos, uma identidade cultural própria. Sua influência é sentida na história e nos movimentos sociais da Nova Escócia. Também é reconhecida como parte do mosaico cultural do Canadá atual.

A Ferrovia Subterrânea: Um Caminho para a Liberdade no Canadá

Estudo de mural “A Ferrovia Subterrânea”, de James Michael Newell

A Lei Contra a Escravidão, aprovada no Alto Canadá em 1793, incluía uma cláusula que determinava que qualquer escravo que chegasse ao território seria considerado livre. A escravidão ainda existia no Alto Canadá nessa época, mas já caminhava para o fim. A promessa de liberdade era extremamente atraente para muitos escravos nos Estados Unidos. Essas pessoas utilizavam um sistema de esconderijos e rotas secretas em sua jornada rumo ao norte, em busca de liberdade.

O Império Britânico aboliu completamente a escravidão em 1834 — cerca de 30 anos antes dos Estados Unidos. Foi por volta dessa época que as pessoas começaram a chamar as diversas rotas secretas do Sul para o Norte de "Ferrovia Subterrânea". Embora não fosse uma ferrovia real, as casas de apoio eram chamadas de estações, e quem as mantinha era chamado de chefe de estação. Aqueles que guiavam os escravizados pelo caminho eram conhecidos como condutores.

Estima-se que, entre 1810 e 1850, o sul dos Estados Unidos perdeu cerca de 100 mil homens, mulheres e crianças escravizados. Desses, aproximadamente 30 mil a 40 mil buscadores de liberdade foram para o Canadá.

Primeiras Comunidades Negras no Canadá

As primeiras comunidades negras começaram a surgir em cidades canadenses como Hamilton, Windsor e Toronto. A maior concentração de imigrantes negros no oeste canadense ficava na região de Chatham-Kent, em Ontário. A seguir, algumas comunidades totalmente negras fundadas em Ontário nesse período:

  • Dawn Settlement, criado por Josiah Henson aproximadamente na mesma época, era um assentamento exclusivamente negro. Josiah Henson foi a inspiração para o personagem Tio Tom no romance A Cabana do Pai Tomás, de Harriet Beecher Stowe. Abaixo, você pode ver fotografias de Josiah Henson e de sua casa em Chatham, Ontário, Canadá.
Uma fotografia de Josiah Henson da década de 1880
Casa de Josiah Henson em Ontário, Canadá

  • Wilberforce, Ontário, foi fundada por cerca de 200 famílias vindas de Cincinnati, Ohio, na década de 1830.
  • O assentamento de Elgin, também conhecido como Buxton, foi fundado por 15 ex-escravos em 1849. Este assentamento tornou-se conhecido por seu excelente sistema escolar. A população da cidade cresceu e chegou a milhares de habitantes. Alguns descendentes dos colonos originais ainda vivem hoje em Buxton, Ontário.

Imigração para o Canadá

Pessoas de comunidades negras do estado de Oklahoma (EUA) começaram a imigrar para as províncias ocidentais do Canadá em 1897. O governo canadense havia começado a recrutar agricultores dos Estados Unidos e da Europa para povoar as províncias de Saskatchewan, Alberta e Manitoba. Como incentivo, oferecia 160 acres de terra para quem limpasse o terreno e pagasse uma taxa de 10 dólares. Agricultores negros em Oklahoma responderam ao chamado.

À medida que mais negros se mudavam para o Canadá, muitos brancos se sentiram ameaçados e pressionaram por novas políticas de imigração. No entanto, essas novas leis não impediram as famílias negras de se estabelecerem no Grande Norte. Entre 1908 e 1911, mais de 1.000 negros de Oklahoma mudaram-se para Alberta e Saskatchewan.

Caribenhos Canadenses

Uma garotinha vestindo traje típico do Caribe.

Você talvez se surpreenda ao saber que os canadenses de origem caribenha formam um dos maiores grupos étnicos do país. De acordo com o censo canadense de 2016, mais de 700 mil pessoas nasceram ou descendem de pessoas nascidas nas Ilhas do Caribe. A maioria dos caribenhos no Canadá vem da Jamaica, mas também há comunidades significativas oriundas do Haiti, Guiana, Trinidad e Barbados, entre outros. As maiores populações de canadenses do Caribe vivem em Toronto, Ontário, e Montreal, Quebec.

Nos últimos 100 anos, três grandes ondas migratórias trouxeram caribenhos ao Canadá: A primeira, entre 1900 e 1960, trouxe cerca de 21 mil pessoas. A segunda, entre 1960 e 1971, ocorreu após a criação de um sistema de pontos nas leis de imigração canadenses, promovendo mais diversidade. Nesse período, o Canadá recebeu aproximadamente 64 mil caribenhos. A terceira onda veio nos anos 1970, com uma média de 20 mil imigrantes por ano.

Afro-canadenses

O Canadá registrou um grande aumento no número de imigrantes africanos na década de 1990. Fatores como instabilidade política, guerras e violência em países como Etiópia, Quênia, Somália e Uganda — além do genocídio em Ruanda e Burundi — levaram muitas pessoas e famílias a buscarem um novo lar. O Canadá era um país que aceitava essas pessoas como refugiadas ou por meio da categoria de reunião familiar, conforme as políticas de imigração canadenses. A maioria dos imigrantes africanos mudou-se para as áreas mais urbanas do país.

Segregação, Racismo e o Movimento dos Direitos Civis no Canadá

Canadenses negros, de todas as gerações, enfrentaram algum tipo de racismo ao longo de suas vidas. A segregação e o racismo eram sentidos mesmo nas idades mais precoces. Algumas crianças negras não tinham permissão para frequentar escolas nos séculos XVIII e XIX. As crianças negras que podiam frequentar escolas comuns geralmente eram obrigadas a sentar separadas de seus colegas brancos ou estudar em salas exclusivas.

Uma turma integrada de alunos da King Street School em Amherstburg, Ontário, 1890

Essa segregação foi intensificada com a aprovação da Lei das Escolas Comuns de 1850. Em Ontário, algumas famílias negras foram obrigadas a criar suas próprias escolas separadas, o que apenas reforçou a segregação. Escolas separadas para negros existiram por mais de 100 anos. A última escola segregada foi fechada em Ontário em 1965 e, na Nova Escócia, em 1983.

O Canadá também apresentava segregação nas forças armadas, na política, em hospitais e em organizações civis. Um exemplo é o das forças armadas, que recusavam voluntários negros até 1939. Outro exemplo foi o de Viola Desmond. Em 1946, Viola Desmond foi presa por sentar-se na seção “exclusiva para brancos” de um cinema local. Sua atitude desafiadora ajudou a abrir caminho para o movimento dos direitos civis no Canadá. Outros líderes proeminentes do Movimento pelos Direitos Civis no Canadá incluem Bromley Armstrong, Donald Willard Moore e Carrie Best.

As comunidades negras canadenses sempre foram diversas em cultura, idioma e raízes, mas muitas enfrentaram desafios semelhantes devido ao racismo. Os obstáculos sistêmicos à inclusão e à igualdade social têm sido difíceis de superar.

Os Negros Canadenses na Atualidade

Um relatório estatístico de 2021 indicou que cerca de 1,5 milhão de canadenses se identificaram como negros. Esses canadenses podem ser divididos, em grande parte, entre os nascidos no Canadá, na África e no Caribe, sendo que esses grupos abrangem mais de 180 países de origem. A maioria dessas populações negras vive em áreas urbanas, especialmente em Toronto e Montreal.

As comunidades negras canadenses são tão diversas que representam mais de 350 origens culturais e étnicas, conforme apontam relatórios estatísticos de 2021. Com essa diversidade, as comunidades negras no Canadá florescem com diferentes línguas, culturas, religiões e tradições.

Descubra Suas Raízes Negras no Canadá

Para descobrir suas raízes familiares negras no Canadá, considere algumas perguntas importantes que podem orientar sua pesquisa:

Um jovem casal negro sorri enquanto está sentado em um sofá com um laptop.

  1. Onde nasceram meus ancestrais negros canadenses? Canadá? Índias Ocidentais? Caribe? Estados Unidos? África?
  2. É possível que alguns membros da família tenham se mudado do Canadá para Serra Leoa na década de 1790?
  3. É possível que ancestrais escravizados tenham viajado pela Ferrovia Subterrânea até o Canadá e depois retornado aos Estados Unidos após a Proclamação de Emancipação?
  4. Meus antepassados negros no Canadá foram escravizados, livres ou contratados por tempo determinado?

Com as respostas a essas perguntas e outras informações que você tiver, consulte os registros disponíveis no FamilySearch.org. O FamilySearch oferece gratuitamente uma conta online para que qualquer pessoa possa visualizar, salvar e baixar milhões de documentos históricos. Confira algumas coleções de registros que você pode começar a explorar hoje mesmo:

  • Censos canadenses – Esses registros foram realizados a cada década e trazem informações como nomes, vínculos familiares, idades, locais de nascimento, imigração e escolaridade. Os dados disponíveis variam conforme o ano do censo.
  • Registros de nascimentos e batismos no Canadá – Geralmente incluem o nome da criança, data e local de nascimento, nomes dos pais e, às vezes, informações adicionais sobre os pais, como idade e local de nascimento.
  • Registros de casamentos no Canadá – As informações variam de acordo com o local e a época do casamento. Podem incluir os nomes dos noivos, data e local da cerimônia, datas e locais de nascimento dos noivos, nomes dos pais e outros dados relevantes.
  • Registros de óbitos e sepultamentos no Canadá —Costumam trazer o nome do falecido, data e local da morte e a causa do óbito. Em alguns casos, também constam a data e o local de nascimento da pessoa falecida, além dos nomes dos pais.

Consulte os seguintes guias para aprofundar sua pesquisa:

(Observação: é possível traduzir essas páginas para vários idiomas utilizando a opção Google Tradutor disponível no menu lateral esquerdo do site.)


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Sobre o autor
Amie Bowser Tennant é pesquisadora, escritora e repórter de genealogia. Ela escreve artigos para blogs e outros conteúdos para muitas das principais empresas e sociedades no campo da genealogia. Ela tem muita experiência como consultora de história da família. Amie mora com seu marido e três filhos em Ohio, cercada por muitos parentes.